Ações tributárias envolvendo a energia, reflexões sobre a legitimidade ativa.

No Poder Judiciário contamos com inúmeras discussões tributárias envolvendo o ICMS, o PIS e a COFINS, muitas com valores consideráveis.


É pacífico no nosso ordenamento jurídico que a energia elétrica é uma mercadoria, portanto sofre a incidência do ICMS, do PIS e da COFINS (Súmula 659 do STF).

Quando o assunto é ICMS, o seu fato gerador, nos termos da Súmula n. 391/STJ e do Tema n. 176/STF, é a tarifa de energia elétrica correspondente à demanda de potência efetivamente utilizada.

Em relação ao PIS e a COFINS, nos termos da nossa Constituição, esses incidem sobre o faturamento, lembrando que os valores inerentes ao ICMS não integram o conceito de faturamento para fins de incidência do PIS e da COFINS conforme decidido pelo Supremo no Tema 69.

Feitos os apontamentos acima, resta-nos responder: De quem é a legitimidade para discutir os tributos ICMS, PIS e COFINS?

Em lides envolvendo o ICMS, como por exemplo, a retirada do ICMS da potência contratada e não utilizada, a exclusão do ICMS da TUSD e TUST, a retirada do ICMS das perdas e outras mais, é pacífico no Superior Tribunal de Justiça que o consumidor final possui a legitimidade para ajuizar a ação tributária competente, vejamos:

 

Tema 537 – “Diante do que dispõe a legislação que disciplina as concessões de serviço público e da peculiar relação envolvendo o Estado-concedente, a concessionária e o consumidor, esse último tem legitimidade para propor ação declaratória c/c repetição de indébito na qual se busca afastar, no tocante ao fornecimento de energia elétrica, a incidência do ICMS sobre a demanda contratada e não utilizada”.

 

Portanto, quanto ao tributo estadual, não temos dúvidas, a legitimidade pertence ao consumidor final, podendo as empresas e as pessoas físicas proporem as respectivas ações em face do Estado.

No entanto, quando a matéria é inerente ao PIS e a COFINS, considerando que o fato gerador desses tributos é o faturamento, o Superior Tribunal de Justiça, em julgamentos recentes, vem afastando a legitimidade dos consumidores e mantendo a das concessionárias, cita-se:

 

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. ENERGIA ELÉTRICA. ICMS. EXCLUSÃO DA BASE DE CÁLCULO DO PIS E COFINS. ILEGITIMDADE ATIVA. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONFRONTO COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. I - Na origem, trata-se de mandado de segurança impetrado por Auto Posto Tradição Ltda. contra a União objetivando excluir o ICMS) da base de cálculo do PIS e Cofins incidentes sobre as faturas de energia elétrica. II - Na sentença extinguiu-se o feito por ilegitimidade ativa. No Tribunal a quo a sentença foi reformada. Esta Corte deu provimento ao recurso especial para restabelecer a sentença. III - A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que os contribuintes de fato, a despeito de suportarem a exação sob a forma de substituição tributária, não detêm legitimidade para ajuizar ações que visem a discutir a exigência fiscal de recolhimento de tributos incidentes sobre o faturamento, como é o caso do PIS e da COFINS. In verbis: (AgInt nos EDcl no REsp n. 1.932.893/RN, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 22/3/2022, DJe de 5/4/2022 e AgInt no AgInt no REsp n. 1.932.473/RN, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 16/11/2021, DJe de 10/12/2021.) IV - Agravo interno improvido. (STJ, AgInt no REsp n. 2.066.724/SC, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 21/8/2023, DJe de 23/8/2023 - grifei)

 

Além do precedente acima mencionado, temos decisões parecidas no REsp 1.999.135/PE, Rel. Ministro Sérgio Kukina, 3.4.2023; REsp 2.049.024/RS, Rel. Ministra Regina Helena Costa, 23.2.2023 e AgInt nos EDcl no REsp n. 1.932.893/RN, Rel. Ministro Og Fernandes, 5.4.2022.

Portanto, em matéria de PIS e COFINS, considerando a jurisprudência recente do STJ (precedentes de 2023 e 2022), temos que não pode o consumidor final direcionar a ação de ressarcimento em face da União Federal, pois, nesse caso, somente a concessionária que faturou tem a legitimidade para requerer o indébito referente ao PIS e a COFINS.

Lembrando que os precedentes do PIS e da COFINS, não se aplicam ao ICMS, pois, o tributo estadual tem como fato gerador o efetivo consumo, ou seja, a tradição ou troca de titularidade, sendo transferido para o consumidor final, razão pela qual, as concessionárias não são partes legítimas para requerer a repetição do indébito em face da Fazenda do Estado.

Mas nem tudo está perdido para o consumidor final quanto aos tributos incidentes sobre o faturamento, temos precedentes do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo autorizando a restituição do PIS e da COFINS repassados pelas concessionárias com o ICMS em suas bases ao consumidor, vejamos:

 

ICMS. Exclusão da base de cálculo do PIS e da COFINS que são cobrados na tarifa de fornecimento de energia elétrica pela CPFL. O ICMS não integra a base de cálculo das contribuições para o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) porque o valor arrecadado a título de ICMS não se incorpora ao patrimônio do contribuinte, não podendo integrar a base de cálculo dessas contribuições, que são destinadas a financiar a seguridade social. Inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS. Entendimento consolidado pelo E. STF no julgamento do RE 574.706/PR em caráter de repercussão geral, posicionamento que suplanta as Súmulas 68 e 94 do C. STJ. O autor é parte legítima para propor a ação por ser o consumidor da energia elétrica distribuída pela concessionária e quem, efetivamente, arca com o pagamento dos tributos embutidos na tarifa. A CPFL, por sua vez, ostenta legitimidade passiva ad causam por ser responsável pela cobrança da tarifa pelo fornecimento da energia elétrica e por indevidamente incluir o ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, pouco importando, então, que a destinatária do recolhimento desses tributos federais seja a União. Ação julgada procedente em primeiro grau. Sentença confirmada. RECURSO DESPROVIDO. (TJSP;  Apelação Cível 1041750-16.2020.8.26.0114; Relator (a): Isabel Cogan; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Público; Foro de Campinas - 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 04/05/2022; Data de Registro: 04/05/2022).

 

Lembrando que esse precedente é aplicável somente para aquele consumidor que conseguir, por meio de nota fiscal, comprovar a transferência financeira desses valores inconstitucionais de PIS e COFINS, no caso em análise, que violaram o Tema n. 69/STF.

Portanto concluímos o presente artigo apontando que o consumidor final tem a legitimidade para discutir com o Fisco Estadual as matérias inerentes ao ICMS-Energia, no entanto, não tem esse a legitimidade para discutir com a União os tributos incidentes sobre o faturamento (PIS e COFINS), porém, uma vez transferido algo inconstitucional, sob a vedação ao enriquecimento sem causa, temos sentenças autorizando a discussão em face da concessionária que repassou o PIS e a COFINS inconstitucionais, ou seja, que violaram o Tema n. 69/STF.

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