Reprodução do texto da COSIT n. 76/2023 Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Física - IRPF

 Ementa: PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. GANHO DE CAPITAL. FATO GERADOR. DISTRATO. IRRELEVÂNCIA. DECLARAÇÃO DE BENS E DIREITOS DA DECLARAÇÃO DE AJUSTE ANUAL. RETIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. A promessa de compra e venda de imóvel configura alienação para fins do disposto na Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988, sendo irrelevante, para efeitos tributários, seu distrato superveniente. Consequentemente, é incabível a retificação da Declaração de Bens e Direitos da Declaração de Ajuste Anual do promitente vendedor, correspondente ao ano-calendário do evento, com o fito de substituir o promissário comprador anterior por outro que venha a celebrar novo contrato de promessa de compra e venda. Dispositivos Legais: Lei nº 5.172, de 25 de outubro 1966 - Código Tributário Nacional (CTN), arts. 109, 116, inciso II, 117 e 118; Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988, art. 3º, § 3º; Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), art. 472; Regulamento do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza (RIR/2018), aprovado pelo Decreto nº 9.580, de 22 de novembro de 2018, art. 128, § 4º, inciso VIII; Instrução Normativa SRF nº 84, de 11 de outubro de 2001, art. 3º, inciso I.


RELATÓRIO.

Trata-se de consulta interposta pela pessoa física acima identificada acerca da situação fática que passa a narrar. 

2. Alega que uma pessoa física "A" (promitente vendedora) alienou imóvel residencial por meio de contrato de promessa de compra e venda com a pessoa física "B" (promissária compradora). "A" informou a referida alienação em sua Declaração de Ajuste Anual do Imposto sobre a Renda de Pessoa Física referente ao exercício de 2019, indicando "B" como promissária compradora. Ressalta, porém, que, depois de apresentada a aludida Declaração, ocorreu distrato da citada promessa de compra e venda. Articula que, posteriormente, surgiu outra pessoa "C" interessada em comprar o imóvel e substituir o promissário comprador "B", sem alteração do valor da transação. 

3. De seguida, interroga se, dentro do prazo de 5 (cinco) anos, "A" pode retificar a Declaração de Ajuste Anual do Imposto sobre a Renda de Pessoa Física relativamente à mencionada promessa de compra e venda de imóvel, alterando o promissário comprador de "B" para "C", em razão do distrato ocorrido entre o promitente vendedor e o promissário comprador originário. 

4. Nesse sentido, traz à colação o art. 117 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional (CTN); o art. 21 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995; o art. 38 da Lei nº 11.196, de 21 de novembro de 2005; as Instruções Normativas SRF nº 84, de 11 de outubro de 2001, e nº 599, de 28 de dezembro de 2005, bem como a pergunta nº 563 da publicação intitulada Perguntas e Respostas IRPF 2021, elaborada por esta Secretaria Especial, disponível na sua página na rede mundial de computadores. 

5. Enfim, presta as declarações exigidas pelo art. 3º, § 2º, inciso II, da Instrução Normativa RFB nº 1.396, de 16 de setembro de 2013. 6. Esse é o relatório.


FUNDAMENTOS


7. Não obstante a sucinta descrição da operação, ressalta-se que a consulta merece conhecimento, frente aos elementos de contextualização nela presentes, visto preencher os requisitos admissionais. Salienta-se, porém, que, com a protocolização de consulta, não se sobrestão prazos de recolhimento de tributo retido na fonte, de entrega de declaração de rendimentos ou de cumprimento de outras obrigações acessórias, tampouco se convalidam informações apresentadas em autos de processo, sem prejuízo do poder-dever da Administração Tributária de, por meio de procedimento fiscal, verificar o efetivo enquadramento do caso concreto na hipótese abrangida pela resposta, conforme previsto no art. 49 do Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972, e nos arts. 9º, 11 e 28 da Instrução Normativa RFB nº 1.396, de 2013, posteriormente substituída pela Instrução Normativa RFB nº 2.058, de 9 de dezembro de 2021, arts. 19, 33 e 45.

8. Adentrando no mérito processual, cabe transcrever o disposto no Regulamento do Imposto sobre a Renda (RIR/2018), aprovado pelo Decreto nº 9.580, de 22 de novembro de 2018, art. 128, (cf. Instrução Normativa SRF nº 84, de 2001, art. 3º, inciso I):

Art. 128. Fica sujeita ao pagamento do imposto sobre a renda de que trata este Título a pessoa física que auferir ganhos de capital na alienação de bens ou direitos de qualquer natureza (Lei nº 7.713, de 1988, arts. 2º e 3º, § 2º; e Lei nº 8.981, de 1995, art. 21). (...) 

§ 2º Os ganhos serão apurados no mês em que forem auferidos e tributados em separado, não integrarão a base de cálculo do imposto sobre a renda na declaração de ajuste anual e o valor do imposto sobre a renda pago não poderá ser deduzido do imposto sobre a renda devido na declaração (Lei nº 8.981, de 1995, art. 21, § 2º). 

(...) 

§ 4º Na apuração do ganho de capital, serão consideradas as operações que importem a alienação, a qualquer título, de bens ou direitos ou a cessão ou a promessa de cessão de direitos à sua aquisição, tais como (Lei nº 7.713, de 1988, art. 3º, § 3º): 

(...) 

VIII - promessa de compra e venda; (...) (grifou-se)

 9. Prevê o art. 21 da Lei nº 8.981, de 1995:

Art. 21. O ganho de capital percebido por pessoa física em decorrência da alienação de bens e direitos de qualquer natureza sujeita-se à incidência do imposto sobre a renda, com as seguintes alíquotas: (Redação dada pela Lei nº 13.259, de 2016) 

(...)  

10. Assinale-se que embora tenha evocado as citadas Lei nº 11.196, de 2005, e Instrução Normativa SRF nº 599, de 2005, a peticionária não as relacionou com o objeto da consulta.

11. Por outro lado, o Código Tributário Nacional preconiza:

Art. 109. Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários. 

(...) 

Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos: 

(...) 

II - tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável. 

(...) 

Art. 117. Para os efeitos do inciso II do artigo anterior e salvo disposição de lei em contrário, os atos ou negócios jurídicos condicionais reputam-se perfeitos e acabados: 

(...) 

II - sendo resolutória a condição, desde o momento da prática do ato ou da celebração do negócio.   

Art. 118. A definição legal do fato gerador é interpretada abstraindo-se: 

I - da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos; 

II - dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos. (ênfase acrescentada)

12. Assim, sendo celebrado o negócio jurídico que a lei define como fato gerador, nasce a obrigação tributária, e esta subsiste independentemente da validade daquele, pelo que, portanto, com o distrato do contrato não desaparecem o fato gerador e a obrigação tributária que dele decorre. 

13. Orientação nesse sentido é encontrada na publicação Perguntas e Respostas IRPF 2021, que esclarece quanto à ocorrência do fato gerador, mesmo na hipótese de rescisão contratual: 

CONTRATO COM CLÁUSULA DE RESCISÃO 563 - Como proceder na hipótese de haver cláusula de promessa de compra e venda prevendo a rescisão do contrato por falta de pagamento? A promessa de compra e venda de imóvel, desde que contenha todos os requisitos legais que regem este negócio jurídico, constitui direito entre as partes, sendo instrumento suficientemente válido para configurar a transmissão dos direitos sobre o imóvel objeto do contrato e a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária. A cláusula que prevê a rescisão do contrato por falta de pagamento do preço ajustado configura modalidade de ato jurídico sob condição resolutória, ou seja, modalidade em que a eficácia do negócio jurídico não fica pendente da ocorrência do evento futuro. Ela apenas extingue o direito já constituído anteriormente pelo instrumento de promessa de compra e venda, em virtude da ocorrência do evento futuro previsto no contrato (falta de pagamento do preço ajustado, no caso). Na hipótese, portanto, por força do art. 117, inciso II, do Código Tributário Nacional (CTN), o ato ou negócio jurídico de alienação do imóvel reputa-se perfeito e acabado, para os efeitos fiscais, a partir da data do instrumento particular ou público de promessa de compra e venda celebrado entre as partes. Esclareça-se que a cláusula de retrovenda é condição resolutória, não suspensiva do ato. Atenção: A rescisão do contrato de alienação não implica restituição do imposto pago pelo alienante. 

14. A consulente não informou se houve ou não o recebimento de sinal ou arras pelo promitente vendedor, tampouco questionou isso no processo de consulta, todavia, informamos que a mesma publicação orienta acerca da forma de apuração do tributo e de registro dos valores porventura recebidos pelo promitente vendedor, na hipótese de rescisão do contrato de promessa de compra e venda por este ou pelo promissário comprador: 

RESCISÃO DE CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA 565 — Qual é o tratamento tributário aplicável no caso de rescisão de contrato de promessa de compra e venda de bens ou direitos? O contrato de promessa de compra e venda, importando em transmissão de bens ou direitos ou na cessão do direito à sua aquisição, caracteriza alienação para os efeitos da Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988, sendo irrelevante, para os efeitos fiscais, a ocorrência de sua rescisão (Código Tributário Nacional (CTN), arts. 116 e 117), ou a existência no instrumento de negociação de cláusula relativa ao desfazimento da transação, em caso de não pagamento de todas as parcelas na alienação a prestação, bem como ao ressarcimento dos valores efetivamente pagos. Assim, a quantia recebida pelo vendedor e posteriormente ressarcida ao comprador é considerada pelo vendedor como parte do preço de alienação, devendo o ganho de capital porventura apurado ser tributado na forma da legislação tributária. Ocorrendo posterior alienação dos mesmos bens ou direitos, é considerado como custo de aquisição: a) o custo de aquisição original acrescido do ganho de capital apurado na venda cancelada por rescisão, antes das reduções (Ganho de Capital 1), no caso de venda à vista; ou b) o custo de aquisição original acrescido da parcela do ganho de capital apurado na venda cancelada por rescisão, antes das reduções (Ganho de Capital 1), correspondente às prestações recebidas, no caso de venda a prazo. Consulte a pergunta 257. CARNÊ-LEÃO - Arras 257 — O valor do sinal ou arras recebido em virtude de rescisão de contrato é tributável? "As arras ou sinal constituem a importância em dinheiro ou a coisa dada por um contratante ao outro, com o escopo de firmar a presunção de acordo final e tornar obrigatório o ajuste; ou ainda, excepcionalmente, com o propósito de assegurar, para cada um dos contratantes, o direito de arrependimento." (Enciclopédia Saraiva do Direito, SP, Saraiva, 1978, V. 8, p. 19). No caso de desistência do negócio por parte do promissário comprador, este perde o sinal dado, que está sujeito ao recolhimento mensal obrigatório (carnê-leão), se recebido de pessoa física, ou à retenção na fonte, se pagos por pessoa jurídica e, em ambos os casos, também ao ajuste na declaração anual, por parte do promitente vendedor. No caso de arrependimento por parte do promitente vendedor, este deve restituir ao promissário comprador o sinal recebido, mais o equivalente. O valor correspondente ao sinal original não sofre incidência de imposto sobre a renda, porém o valor recebido a maior (inclusive correção monetária e juros) é tributado no carnê-leão. Exemplo: O promissário comprador Valter pagou a Gábor, promitente vendedor, a importância de R$ 20.000,00 como sinal pela aquisição de imóvel. Valter, promissário comprador, arrependeu-se do negócio antes da escritura definitiva, perdendo para Gábor o sinal pago. O promitente vendedor, Gábor, deve tributar o valor do sinal recebido (R$ 20.000,00) como carnê-leão. Tomando-se por base o exemplo acima, considere que a desistência do negócio tenha sido feita pelo promitente vendedor, Gábor. Nesse novo exemplo, em atendimento aos termos do art. 418 do Código Civil, Gábor deve devolver o sinal recebido de Valter mais o equivalente, isto é, R$ 40.000,00. O valor relativo ao sinal devolvido (R$ 20.000,00) constitui, para Valter, rendimento não tributável. Os restantes R$ 20.000,00 devem ser tributados como carnê-leão. (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil, art. 418). (destacou-se) 

15. Salienta-se que as perguntas retro citadas utilizam a expressão rescisão na forma genérica, portanto, os seus comandos aplicam-se, com os devidos ajustes, à hipótese de extinção contratual pelo distrato, mormente nas hipóteses em que, por força das cláusulas contratuais da promessa de compra e venda, tenha havido transferência de recursos entre os contratantes.

CONCLUSÃO 

16. Diante do exposto, conclui-se que a promessa de compra e venda de imóvel configura alienação para fins do disposto na Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988, sendo irrelevante, para efeitos tributários, seu distrato superveniente. Portanto, é incabível a retificação da Declaração de Bens e Direitos da Declaração de Ajuste Anual do promitente vendedor, correspondente ao anocalendário do evento, com o fito de substituir o promissário comprador anterior por outro que venha a celebrar novo contrato de promessa de compra e venda. 

 É o entendimento. Encaminhe-se para procedimento próprio. 

Assinatura digital CLEUSA MAGALHÃES Auditora-Fiscal da Receita Federal do Brasil De acordo. Remeta-se ao Coordenador da Coordenação de Tributos sobre a Renda, Patrimônio e Operações Financeiras (Cotir). Assinatura digital NEWTON RAIMUNDO BARBOSA DA SILVA Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil Chefe da Divisão de Impostos sobre a Renda de Pessoa Física e a Propriedade Rural (Dirpf) De acordo. Encaminhe-se à Coordenadora-Geral de Tributação, para aprovação. Assinatura digital FABIO CEMBRANEL Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil Coordenador da Cotir ORDEM DE INTIMAÇÃO Aprovo a Solução de Consulta acima. Divulgue-se e publique-se nos termos do art. 43 da Instrução Normativa RFB nº 2.058, de 9 de dezembro de 2021. Dê-se ciência ao interessado. Assinatura digital RODRIGO AUGUSTO VERLY DE OLIVEIRA Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil Coordenador-Geral de Tributação 




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