O Fiador em contrato de locação pode perder o seu bem de família?
Nos
contratos de locação não é rara a figura do "fiador", muitas pessoas
acabam aceitando esse encargo e assinam o contrato, contudo, não sendo ele
adimplido, havendo a sua execução, muitos se questionam: Posso alegar a
impenhorabilidade da Lei n. 8.009/1990 (bem de família) para não ver a minha
residência penhorada?
Não vou
mentir, tampouco iludir o leitor, atualmente existem argumentos fortes e
favoráveis à penhora tanto na Lei, quanto na doutrina e na jurisprudência,
inclusive a própria Lei n. 8.009/1990 (Lei do Bem de Família) diz claramente o
seguinte:
"Art. 3º A impenhorabilidade
é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária,
trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
(...)
VII - por obrigação
decorrente de fiança concedida em contrato de locação."
Inclusive
a doutrina nos esclarece que em 2015 o STJ publicou a Súmula de n. 549 tornando
válida a penhora do bem de família de propriedade do fiador de um contrato de
locação, vejamos:
"Recentemente, foi editada
Súmula pelo Superior Tribunal de Justiça, com a finalidade de uniformizar os
julgados quanto à matéria. A Súmula 549, cuja publicação se deu em 19 de
outubro de 2015, estabelece que: “É válida a penhora de bem de família
pertencente a fiador de contrato de locação". (DUTRA, Maristela
Aparecida, DE ANDRADE, Fernanda Aparecida Broges, IMPENHORABILIDADE DO BEM DE
FAMÍLIA, Revista Jurídica UNIARAXÁ, Araxá, v. 21, n. 20, p. 245-268, ago.
2017. p. 255 - grifamos).
E como se
não bastasse a Súmula n. 549 do STJ entendendo pela possibilidade de penhora do
bem de família nas fianças em contrato de locação, temos vários Temas do Supremo e algumas Súmulas dos Tribunais de Justiça espalhados pelo país
permitindo a mencionada penhora, cita-se:
Tema 295/STF: "É
constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de
locação, em virtude da compatibilidade da exceção prevista no art. 3°, VII,
da Lei 8.009/1990 com o direito à moradia consagrado no art. 6° da Constituição
Federal, com redação da EC 26/2000. (Grifei).
Tema 1127/STF: É
constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de
locação, seja residencial, seja comercial. (Grifei)
Súmula 8 do TJ/SP:"É
penhorável o único imóvel do fiador em contrato locatício, nos
termos do art. 3º, VII, da Lei 8.009, de 29.03.1990, mesmo após o advento da
Emenda Constitucional nº 26, de 14.02.2000". (Grifei).
Súmula 63 do TJ/RJ: “Cabe a
incidência de penhora sobre imóvel único do fiador de contrato de locação,
Lei nº. 8009/90 (art. 3º, VII) e Lei nº. 8245/91." Referência: Súmula da
Jurisprudência Predominante nº. 2001.146.00005. Julgamento em 24/06/2002.
Relator: Desembargador Paulo Ventura. Votação por maioria. Registro do Acórdão
em 14/08/2003. (Grifei).
Não é
demasiado reforçar que em 2022 encontramos uma série de deferimentos à penhora
do único imóvel do fiador de um contrato de locação, vejamos os Acórdãos dos Tribunais de Justiça:
"*Agravo de instrumento.
Execução de Título Extrajudicial. Contrato de locação de imóvel residencial.
DECISÃO que deferiu a penhora do imóvel da fiadora executada. INCONFORMISMO
deduzido no Recurso. EXAME: Arguição de que a Execução é fundada em Instrumento
Particular de Confissão de Dívida. Ação que visa à cobrança dos locativos
mensais. Confissão que não implica novação da dívida, mas apenas o parcelamento
do débito pendente. Possibilidade de penhora de "bem de
família" pertencente ao locatário ou ao fiador de locação residencial ou
comercial para a execução de débito locatício, que tem amparo no artigo 3º,
inciso VII, da Lei nº 8.009/90. Decisão mantida. RECURSO NÃO
PROVIDO.*" (TJSP; Agravo de Instrumento 2092263-51.2022.8.26.0000;
Relator (a): Daise Fajardo Nogueira Jacot; Órgão Julgador: 27ª Câmara de
Direito Privado; Foro de Sumaré - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento:
17/08/2022; Data de Registro: 17/08/2022- Grifei).
"IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO
DE SENTENÇA - FIADOR DE CONTRATO DE LOCAÇÃO – PENHORA DO BEM DE FAMÍLIA –
POSSIBILIDADE - EXCEÇÃO LEGAL - ART. 3º, VII, LEI 8.009/90. Nos termos do
artigo 3º, inciso VII, da Lei nº 8.009/90, perfeitamente possível a
penhora do imóvel residencial "por obrigação decorrente de fiança
concedida em contrato de locação. RECURSO DESPROVIDO" (TJSP;
Agravo de Instrumento 2148676-84.2022.8.26.0000; Relator (a): Andrade Neto;
Órgão Julgador: 30ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional XV - Butantã - 2ª
Vara Cível; Data do Julgamento: 10/08/2022; Data de Registro: 10/08/2022 -
Grifei).
"AGRAVO DE INSTRUMENTO.
Gratuidade da justiça deferida apenas para fins de processamento deste recurso.
Ação de despejo e cobrança em fase de cumprimento de sentença. Penhora
de bem de família de propriedade do fiador de contrato de locação.
Possibilidade. Hipótese em que a impenhorabilidade do bem de família não é
oponível ao exequente. Inteligência do art. 3º, VII, da Lei 8.009/90.
Súmula 549 do E. STJ. Precedentes da jurisprudência. Recurso provido em
parte" (TJSP; Agravo de Instrumento 2132837-19.2022.8.26.0000;
Relator (a): Milton Carvalho; Órgão Julgador: 36ª Câmara de Direito Privado;
Foro de Ribeirão Preto - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 28/06/2022; Data de
Registro: 28/06/2022 - Grifei).
"EMENTA: AGRAVO DE
INSTRUMENTO - AÇÃO DE DESPEJO EM FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - CONTRATO
DE LOCAÇÃO COMERCIAL - INADIMPLEMENTO - PENHORA DE IMÓVEL DO FIADOR -
POSSIBILIDADE - ART. 3º, VII, DA LEI 8.009/90 - MANUTENÇÃO DA
DECISÃO AGRAVADA - LITIGANCIA DE MÁ FÉ - AFASTADA. - Nos termos do art. 3º,
VII, da Lei 8.009/1990, é legítima a penhora de alegado bem de
família pertencente a fiador de contrato de locação. - Não estando
presentes quaisquer das hipóteses discriminadas no art. 80 do CPC, não há que
se falar em litigância de má-fé." (TJMG - Agravo de
Instrumento-Cv 1.0000.17.073187-1/004, Relator(a): Des.(a) Sérgio André
da Fonseca Xavier , 18ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 05/07/2022, publicação da
súmula em 05/07/2022).
"EMENTA: AGRAVO DE
INSTRUMENTO - AÇÃO DE EXECUÇÃO - VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA NÃO SUPRESA -
INOCORRÊNCIA - PENHORA - BEM DE FAMÍLIA - CONTRATO DE LOCAÇÃO
COMÉRCIAL - POSSIBILIDADE. Não se verifica violação ao princípio da não
surpresa (CPC, art.10) quando o magistrado decide acerca de matérias das quais
as partes tiveram oportunidade de se manifestar. "O enunciado processual
da não surpresa não implica exigir do julgador que toda solução dada ao
deslinde da controvérsia seja objeto de consulta às partes antes da efetiva
prestação jurisdicional" (AgInt no AREsp 1967559/DF, Rel. Ministro MARCO
BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 22/02/2022, DJe 10/03/2022)."É
constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de
locação, seja residencial, seja comercial" (RE
1.307.334)". (TJMG - Agravo de Instrumento-Cv
1.0000.22.042407-1/001, Relator(a): Des.(a) Marcelo Pereira da Silva , 12ª
CÂMARA CÍVEL, julgamento em 26/05/2022, publicação da súmula em 31/05/2022-
Grifei).
"AGRAVO DE INSTRUMENTO –
CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – COBRANÇA DE VERBAS LOCATÍCIAS – CONTRATO DE
LOCAÇAO COMERCIAL - PENHORA DE IMÓVEL – BEM DE FAMÍLIA – POSSIBILIDADE -
O c. Supremo Tribunal Federal, ao realizar o julgamento, com repercussão geral
(Tema 1127), fixou o entendimento no sentido da constitucionalidade
da penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, seja
comercial, seja residencial. Penhora subsistente. Decisão mantida.
RECURSO NÃO PROVIDO" (TJSP; Agravo de Instrumento
2090919-35.2022.8.26.0000; Relator (a): Maria Lúcia Pizzotti; Órgão Julgador:
30ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional III - Jabaquara - 3ª Vara Cível;
Data do Julgamento: 08/06/2022; Data de Registro: 08/06/2022 - Grifei).
Diante do exposto, entendo que é possível a penhora do bem de família do fiador, não sendo uma defesa inteligente argumentar a impenhorabilidade do bem de família, haja vista a gama gigantesca de precedentes em sentido contrário, por essa razão, o ideal é buscar por acordos com o credor para o fim de quitar a dívida, assim evitando a penhora do bem de família.
Texto escrito por João Vitor
Rossi, advogado inscrito na OAB/SP 425.279, graduado em Direito pelo Centro
Universitário Padre Albino (UNIFIPA), pós-graduado em Direito Processual Civil
pela Universidade de Araraquara (UNIARA) e graduado em Administração pela
Universidade de Uberaba (UNIUBE).
Aviso: Não estimulamos a litigância em massa, pondere com um advogado de sua confiança antes de entrar com qualquer medida judicial, analise os riscos, não existe causa ganha na Justiça brasileira e um processo pode se prolongar por anos. O autor lembra que o presente conteúdo é informativo, não podendo ser lido como um parecer jurídico.
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